Vou te amar pra sempre até junho.



Vou te amar pra sempre até junho.

 

Nas últimas décadas as empresas têm mais e mais investido em relacionamento. É CRM, é feliz aniversário, é saber se tem filhos… Algumas vão tão longe a ponto de saber o número do sapato. Nem eu sei o meu número de sapato se não olhar de vez em quando, mas em algum sistema de CRM tem alguém que se preocupou em saber o seu.

Mas poucas são tão dedicadas a manter um cliente como uma empresa de telecomunicações. Porque por mais que você compre sabonete todo mês, cada vez que vai a gôndola tem a sua frente toda uma variedade para escolher por cheiro, glicerina, se mata germes (ou se só dá um susto neles). Mas celular e internet já são como água, luz e gás encanado. Você recebe um boleto todo mês e pronto. Ou já está débito automático. Ninguém olha, ninguém vê.

Sim, existe o pré-pago. Mas é no mensal que as operadoras do ramo encontram aquele nirvana de valor garantido todo mês. São planos mais caros, e aí começa o mundo dos pontos de fidelidade.

Troque por outro aparelho. Troque por ingresso de cinema. Troque por mais velocidade. Isso pra você, que é especial.

Tanto que você abre a conta da TV a cabo mesmo e está lá: desconto fidelidade. Aquele contrato que, por você continuar o namoro, fica mais barato. Porque você é especial.

Mas antes vamos pensar o que significa Fidelidade em um mundo onde 50% dos casamentos acabam em divórcio. Fidelidade significa não enganar, significa que ambas as partes respeitam o relacionamento.

Claro, é um relacionamento aberto. Você pode até ser fiel e ter só uma internet em casa (afinal, quem tem duas?) mas a outra ponta tem vários relacionamentos. Como era de se esperar, afinal é disso que as empresas vivem, de ter vários clientes.

A questão no relacionamento é como administrar tantas relações ao mesmo tempo. Porque igual a você, existem milhares. Perdão. Milhões. Se você acaba esse namoro a fila anda tão rápido que você nem viu. Fazem de tudo para você não cancelar – exceto eventualmente resolver o problema que lhe aflige – mas você sabe que ela, a operadora, não vai sentir sua falta. E isso transparece no número gigantesco de reclamações no segmento.

Pense em um carro. São feitos milhares do mesmo carro todos os anos. Se neste período, mais de 70 mil pessoas reclamassem de problemas no carro, o que seria mais fácil acreditar: que existem 70 mil parafusos com defeito, ou que existe algum erro entre o projeto e a fabricação que causaram milhares de erros da mesma natureza?

Exato, os mesmos problemas repetidos milhares de vezes. Sistematicamente, afetando dezenas de milhares de consumidores.

Dai este que voz fala trocou de operadora. O atendente da loja me ofereceu um plano maior do que eu pedi porque, com o desconto de portabilidade, ficava mais barato ter SMS e mais quantidade de dados transferidos. Não aceitei. Ele insistiu. Não era um desconto, era um fato. Sabendo somar como bom aluno que fui, enfim concordei. Péssimo aluno. Porque o fato que era eterno durou poucos meses. Vou te amar pra sempre, mas só até junho.

Ligando na operadora, vem o discurso esperado: “O valor é reduzido? Nada. Se o vendedor disse isso ele se enganou”.
Uma forma bonita de dizer “ele te enganou”. Mas o vendedor não é nenhum gênio do mal, nem o dono do boleto.
E neste momento você percebe que é um cliente de um tipo especial de “especial”.

Valeu telecoms. O consumidor agradece.